O plenário do Tribunal de Contas da União vai julgar, em sessão secreta marcada para esta quarta-feira, uma auditoria de mais de 80 páginas que analisou os gastos com cartão corporativo do presidente Jair Bolsonaro e seus familiares. O relator do processo é o ministro Raimundo Carreiro, indicado pelo presidente da República para assumir a embaixada do Brasil em Portugal.
A auditoria foi feita pela equipe técnica do TCU e analisou os gastos, ao longo de 2019, de mais de R$ 14,8 milhões de reais de Jair Bolsonaro e seus familiares. Conforme mostrou O GLOBO no último dia 19, Carreiro foi alvo de um pedido de suspeição da relatoria do caso feito pelo deputado Elias Vaz (PSB-GO), integrante da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara dos Deputados. Elias Vaz é quem assina o pedido de fiscalização dos gastos do presidente.
No pedido de suspeição, o deputado questiona a imparcialidade de Carreiro para analisar os gastos do presidente, já que o ministro foi convidado, pelo próprio Jair Bolsonaro, para assumir a embaixada do Brasil em Portugal.
— Dois aspectos que chamam à atenção. Uma é o ministro não ter se declarado impedido. Agora esse fato de o julgamento ser sigiloso, de a população não poder acompanhar. Isso está gerando indignação — disse o deputado.
O parlamentar avalia “que a população tem o direito de saber” com que o presidente Jair Bolsonaro tem gasto, em média, R$ 1,5 milhões por mês com cartão corporativo.
— E agora o ministro sendo premiado com uma vaga de embaixador em Portugal. O que queremos é transparência — acrescentou.
Carreiro declarou há duas semanas ao GLOBO que não se sentia impedido de analisar o caso e prometeu pautar o julgamento, o que de fato ocorreu nesta terça-feira. O ministro, porém, definiu que a sessão será sigilosa. O acórdão também será mantido em sigilo.
Impedimento
A relatoria do pedido de suspeição de Carreiro na apuração dos cartões corporativos ficou com o ministro Bruno Dantas, que ainda não decidiu se aceita ou rejeita a solicitação protocolada pelo deputado Elias Vaz.
“A arguição de impedimento/suspeição solicitada pelo deputado Eliaz Vaz, está sendo tratada no TC 043.888/2021-6, autuado dia 25/11, ainda sem deliberação”, diz, em nota, o TCU.
A assessoria da corte ainda justificou o caráter sigiloso da sessão de amanhã alegando que a “natureza sigilosa das despesas analisadas na auditoria impõe o caráter igualmente reservado aos autos”.
Quanto ao acesso ao resultado da auditoria, a assessoria da corte disse ser “necessário aguardar a decisão do plenário”. Há dois anos a comissão de Controle da Câmara tenta ter acesso aos gastos do cartão corporativo de Bolsonaro. Em maio, o colegiado solicitou ao TCU uma auditoria nas despesas sigilosas do cartão utilizado pelo presidente da República para alimentação, hospedagem, transporte e entretenimento.
O processo, conduzido por Carreiro, tramitou sob sigilo e foi concluído no dia 28 de setembro. Desde então, o caso se encontrava à espera de um despacho do ministro para ir ao plenário. No último dia 4 de novembro, durante cerimônia de abertura do leilão do 5G, Bolsonaro fez elogios públicos a Carreiro.
— Não tem quem não seja apaixonado pelo Carreiro, não tem — disse o presidente, que acrescentou: — É uma das pessoas que marcou a posição nesse evento.
Carreiro comentou: — Sobre o elogio de Bolsonaro a mim, eu fiquei muito lisonjeado, pois tenho 52 anos de serviço público. Se o presidente da República reconheceu, eu só posso ficar grato.
No dia 9 de novembro, a colunista Malu Gaspar antecipou que o governo português havia concedido o agrément para a indicação de Carreiro à embaixada do Brasil em Portugal. O documento chancela a indicação do presidente. O ministro do TCU deve substituir Carlos Alberto Simas Magalhães, que deve ser enviado a outro posto.
No pedido de suspeição de Carreiro, o parlamentar destaca que a família do presidente da República vem tendo gastos recordes com cartão corporativo, a um custo médio mensal de R$ 1,5 milhão. Em 2019, a despesa foi de R$ 14,8 milhões. Em 2020, saltou para 19,1 milhões. Neste ano, até outubro, o custo acumulado soma R$ 14,4 milhões com os cartões da Presidência. Procurado, o Palácio do Planalto não se manifestou.