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Ricardo sabia de esquema de propina e mandava dirigente do Botafogo comprar juízes, denuncia Esporte Espetacular

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Seis meses depois da Operação Cartola, em que a Polícia Civil e o Ministério Público da Paraíba revelaram um grande esquema de manipulação de resultados no Campeonato Paraibano, dirigentes de clubes e federação continuam sob a mira dos investigadores. O Esporte Espetacular teve acesso ao processo que tramita na 4ª Vara Criminal do estado e encontrou novas irregularidades que expandiram-se para fora dos campos de futebol.

No decorrer de oito meses de investigação, aproximadamente 105 mil ligações telefônicas de pessoas suspeitas foram gravadas, com autorização judicial. Algumas delas indicam que os acusados teriam, inclusive, tentado exercer sua influência utilizando-se de uma suposta proximidade com o governador da Paraíba e a Polícia Militar, em benefício próprio.

Veja o vídeo clicando AQUI

Segundo a Polícia Civil, 80 pessoas foram investigadas no esquema. A operação teve como objetivo apurar crimes cometidos por uma organização composta por membros da Federação Paraibana de Futebol (FPF), Comissão Estadual de Arbitragem da Paraíba (CEAF), Tribunal de Justiça Desportiva da Paraíba (TJD/PB) e dirigentes de clubes de futebol profissional da Paraíba e árbitros.

Uma das transcrições a que a reportagem teve acesso relata um diálogo peculiar entre dirigentes do Botafogo-PB. Zezinho, então presidente do clube, e Breno, ex-vice de futebol, falam sobre a derrota por 4 a 0 sofrida pelo Botafogo-PB pelo Atlético-MG, válida pela Copa do Brasil, em João Pessoa.

Breno conta a Zezinho que teria assistido ao jogo ao lado do governador do estado, Ricardo Coutinho, que, incomodado com a goleada imposta pelo time visitante, teria lamentado que o dirigente não tivesse pago propina ao árbitro para beneficiar a equipe da casa. Segundo o dirigente, o governador teria dito: “Breno, o certo era você ter comprado o juiz de um jogo desse aí“, que disse ter respondido: “Eu sei, mas não tive jeito de chegar.”

Questionado, Breno disse não ter relação próxima com o governador. No entanto, um vídeo divulgado logo após a Operação Cartola mostra o político saindo em defesa do ex-vice de futebol do Botafogo.

– Meu querido amigo Breno. Breno que é um injustiçado, viu? Esse negócio do cabra com a caneta achar que vai dar na cara de todo mundo, que vai acabar com a vida do outro e não tem nada pra provar, esse negócio tá cheio no brasil aí, viu? – disse o governador Ricardo Coutinho, no vídeo.

De acordo a investigação, o forte poder econômico do grupo era outra ferramenta utilizada em irregularidades cometidas em favor do Botafogo-PB. Na Copa do Nordeste deste ano, o time da Paraíba fazia parte do Grupo C, com Bahia, Náutico e Altos do Piauí. O Botafogo-PB chegou à última rodada da primeira fase na liderança de sua chave. Mas, se perdesse para o Bahia, e o Náutico vencesse o Altos-PI, poderia ser eliminado. Então, os dirigentes do clube vislumbraram a possibilidade de oferecer uma quantia para “motivar” os jogadores da equipe do Piauí, conduta conhecida como “mala branca”. O diálogo foi o seguinte:

  • BRENO: “A gente tem que mandar um incentivo pra ele”.
  • ZEZINHO: “Exato, não tem outra saída não”.
  • BRENO: “Tem que botar cinquenta mil lá pra eles, no mínimo”.
  • ZEZINHO: “Eu tenho o telefone do presidente lá”.
Trecho de diálogo gravado entre ex-presidente do Botafogo-PB e homem que a polícia acredita ser presidente do Altos, do Piauí, indica "mala branca" na Copa do Nordeste — Foto: Reprodução

Trecho de diálogo gravado entre ex-presidente do Botafogo-PB e homem que a polícia acredita ser presidente do Altos, do Piauí, indica “mala branca” na Copa do Nordeste — Foto: Reprodução

No dia seguinte, o então presidente do Botafogo-PB ligou para um homem, que a polícia acredita ser o presidente do Altos-PI, Warton Lacerda.

  • ZEZINHO: “Presidente? Presidente?”
  • WARTON: “Opa, como é que tá, Zezinho?”
  • ZEZINHO: “Eu vou ver aqui com o pessoal pra gente mandar aí alguma coisa pra vocês ganharem o jogo ou empatar”.
  • WARTON: “Tá bom”.
  • ZEZINHO: “Pra vocês tirarem ponto do Náutico, viu?”
  • WARTON: “Eu tô aqui à disposição. Nós vamos jogar como se fosse uma final esse jogo”.
  • ZEZINHO: “A gente sabe que você trabalha de forma legal aí, vocês são corretos igual a gente. É verdade.”

Como os dirigentes planejaram, o jogo entre Náutico e Altos acabou empatado por 2 a 2 e, com isso, o Botafogo avançou à fase seguinte da Copa do Nordeste.

Zezinho foi procurado pela reportagem, mas não quis comentar sobre as acusações. Em entrevista, o presidente do Altos confirmou ter recebido uma oferta de dinheiro vinda do dirigente do Botafogo. Contudo, afirmou que seu time sempre entra nas partidas para vencer e que acha a prática de “mala branca normal”.

– Na verdade, ele disse que seria um incentivo, não seria nada por aposta. Eu não considero imoral até porque o estatuto do torcedor não diz que é imoral – disse Warton.

O Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) é claro ao tratar do assunto. O artigo 242 diz que dar ou prometer vantagem indevida a dirigente, técnico e atleta para influenciar o resultado da partida é uma conduta passiva de multa e eliminação de competições.

Código Brasileiro de Justiça Desportiva aponta que a "mala branca" é passível de multa e até eliminação da competição — Foto: reprodução

Código Brasileiro de Justiça Desportiva aponta que a “mala branca” é passível de multa e até eliminação da competição — Foto: reprodução

O poder econômico dos investigados também era usado para manter irregularidades às escuras. O relatório da Polícia Civil aponta que Amadeu Rodrigues, então presidente da Federação Paraibana de Futebol (FPF), pagava propina a jornalistas locais para evitar a produção de notícias sobre os atos de corrupção que teriam sido cometidos na entidade.

Em um bilhete apreendido pela polícia durante a operação há uma anotação na qual Amadeu pede a uma funcionária da FPF para pegar R$ 2 mil reais com Marcos Souto, ex-diretor jurídico da entidade, para pagar a um repórter. Em outra anotação, a funcionária é orientada a pagar a outro jornalista. Dessa vez, uma quantia de R$1,5 mil reais.

Jornalistas locais foram subornados para não produzirem reportagens sobre atos de corrupção na Federação Paraibana — Foto: Reprodução

Jornalistas locais foram subornados para não produzirem reportagens sobre atos de corrupção na Federação Paraibana — Foto: Reprodução

A reportagem procurou Amadeu em um condomínio de luxo em João Pessoa, tentou ainda contactá-lo por telefone, mas o ex-dirigente não foi localizado pela reportagem para responder aos questionamentos. O sindicato dos jornalistas da Paraíba, por sua vez, afirmou que as denúncias devem ser investigadas e que repudia esse tipo de conduta.

Bilhete apreendido pela Polícia mostra anotação do presidente da Federação Paraibana pedindo pagamento de suborno a jornalista — Foto: Reprodução

Bilhete apreendido pela Polícia mostra anotação do presidente da Federação Paraibana pedindo pagamento de suborno a jornalista — Foto: Reprodução

No curso da reportagem, diversas fontes ligadas às investigações e partes envolvidas no processo relataram ter sofrido pressão política para atenuar o ímpeto da Operação Cartola. Alguns, inclusive, afirmam ter recebido ameaças. A Polícia Civil não fala mais sobre o assunto. Os inquéritos sobre a organização criminosa que tramitavam na Delegacia de Defraudações foram encerrados.

Ministério Público ofereceu à Justiça três denúncias contra 27 pessoas. Por enquanto, não foram feitos pedidos de prisão, só de afastamento dos envolvidos das funções relacionadas ao futebol. As suspensões atingiram Breno, Zezinho e Amadeu. Neste mês, o Botafogo-PB elegeu um novo presidente, assim como a FPF. Procurado, o clube não quis se posicionar. Já a federação, por meio de nota, afirmou que está trabalhando para reestruturar a entidade, com o auxílio da CBF e que tem colaborado com a Polícia Civil e MP.

– O que acontece é que diversos materiais foram apreendidos – tanto no que diz respeito a documentos como eletrônicos. E esse material que foi apreendido, ainda está passivo de análise e a análise pode mostrar outras evidências, algumas evidências que a gente pode usar para agregar as denúncias já articuladas ou dar origem a outras investigações – disse o promotor do MP Rafael Linhares.

Na Justiça Desportiva, 17 pessoas foram denunciadas. O primeiro julgamento estava marcado para a última quarta-feira, mas os auditores da 3ª Comissão Disciplinar do STJD entenderam que não teriam competência para analisar o caso. Com isso, o presidente da entidade remeteu o processo ao Pleno, que é a última instância do tribunal. O julgamento está previsto para novembro.

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