O ministro Sergio Moro (Justiça) disse nesta quarta-feira (4) que o atual momento é relevante para o Congresso “mandar uma mensagem à população” e acelerar a votação de projetos que autorizam a volta da prisão logo após a condenação em segunda instância, o que foi derrubado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
A discussão no Congresso ganhou força após a soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no início de novembro, beneficiado pela reviravolta no Supremo. Lula tem duas condenações em segunda instância e, assim como os demais nessa situação, só poderá ser preso novamente ao final de todos os recursos -no chamado trânsito em julgado dos casos.
“Não haveria melhor mensagem do que o restabelecimento da prisão após condenação em segunda instância. A decisão se é por PEC, se é por PL [projeto de lei] ou se é por ambos cabe ao Congresso”, afirmou Moro. “Se tem uma maioria no Congresso para aprovar esta medida, não vejo lá muito sentido para postergação.”
Moro participou nesta quarta-feira de audiência pública na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado.
A cúpula do Senado, com apoio de partidos de oposição, defende a ideia de que a Casa abrace a PEC que está na Câmara. Uma proposta de emenda constitucional precisa da aprovação de 49 dos 81 senadores e 308 dos 513 deputados e tem uma tramitação mais demorada.
Por outro lado, um grupo de senadores que têm a Operação Lava Jato como uma de suas principais bandeiras diz ter maioria no Senado para aprovar o projeto de lei que está na CCJ da Casa para alterar o Código de Processo Penal (CPP).
Por se tratar de uma alteração infraconstitucional, tem tramitação mais rápida e pode ser aprovada por maioria simples na Câmara e no Senado.
Independentemente de qual proposta será levada adiante, já há consenso de que a decisão ficará para 2020.
O texto que está no Senado é um projeto de lei que altera dois artigos (283 e 637) e cria um novo (617-A) no Código de Processo Penal, sem necessidade de mudança constitucional.
Já a Câmara trabalha com uma PEC. Inicialmente, ela mudava o inciso 57 do artigo 5º da Constituição, que diz que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória -no entendimento de hoje, até que acabem todas as possibilidades de recurso e que a sentença se torne definitiva.
Por esta versão, ninguém seria considerado culpado até a confirmação de sentença penal condenatória em grau de recurso -ou seja, a prisão já valeria após condenação em segunda instância.
Há divergências, no entanto, sobre se esse inciso do artigo 5º seria uma cláusula pétrea da Constituição, o que impediria qualquer modificação, mesmo por emenda.
Diante de uma eventual guerra jurídica envolvendo esse ponto, a solução encontrada pelo relator da proposta na Câmara foi sugerir uma nova PEC, com alterações nos artigos 102 e 105 da Constituição, itens que dispõem, respectivamente, sobre o STF e o STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Líderes partidários entendem que este texto atinge outras esferas da Justiça -cível e tributária-, não se restringindo à área criminal.
Assim, acreditam que a medida acabará obrigando a antecipação do pagamento de precatórios, já que a proposta prevê execução antecipada de pena para todas as ações que chegarem ao STJ.
ENTENDA A DISCUSSÃO SOBRE PRISÃO APÓS SEGUNDA INSTÂNCIA
Qual o atual entendimento sobre prisão de condenados em segunda instância?
Em julgamento no início de novembro, o STF decidiu que é necessário aguardar o trânsito em julgado (quando se esgotam as possibilidades de recurso) do processo para que um réu comece a cumprir a pena a que foi sentenciado. Desde 2016, a jurisprudência em vigor autorizava a prisão após condenação em segunda instância.
O que propõe o Congresso?
Há ao menos duas possibilidades em discussão:
- Na Câmara
Proposta: foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça uma proposta de emenda à Constituição que, na prática, altera o que é considerado trânsito em julgado. O processo transitaria em julgado após a sentença em segunda instância, o que permitiria a prisão depois dessa etapa. Ainda seria possível recorrer às cortes superiores, mas o nome da ação em si deixa de ser recurso e passa a ser ação revisional
O que precisa: aprovação no plenário por três quintos dos parlamentares, em dois turnos de votação em cada uma das Casas
- No Senado
Proposta: Projeto de lei alteraria o artigo 283 do Código de Processo Penal, que diz que “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”. Foi esse o artigo declarado constitucional pelo Supremo no julgamento que barrou a prisão logo após segunda instância
O que precisa: aprovação por maioria simples, em votação nas duas Casas
Folha