A chamada bancada da bala, grupo de deputados que defende a revogação do Estatuto do Desarmamento e o endurecimento da legislação penal, quer ampliar o poder e a influência na Câmara. Na esteira do fenômeno Jair Bolsonaro (PSL), que venceu o primeiro turno da corrida presidencial e elegeu correligionários aos montes para a Câmara e o Senado, a ideia é comandar ao menos três das principais comissões, além da própria presidência da Casa: a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a Comissão de Direitos Humanos (CDH) e a Comissão de Segurança Pública (CSP). E, a depender das negociações, outras mais.
“A Comissão de Relações Exteriores, normalmente, cai com a gente mesmo. Mas essas três [CCJ, a mais importante, CDH e CSP] a gente precisa pegar”, disse ao Congresso em Focoo deputado Capitão Augusto (PR-SP).
Ele mesmo é pré-candidato à presidência da Câmara. O parlamentar paulista fechou acordo com o colega Alberto Fraga (DEM-DF), um dos principais membros da bancada da bala, para herdar a coordenação da Frente Parlamentar da Segurança Pública, grupo que reúne 299 deputados – nem todos prioritariamente engajados na defesa do setor, vale frisar. Derrotado na disputa pelo governo do Distrito Federal, Fraga deixa o comando da agremiação a partir de 2 de fevereiro de 2019, quando tomam posse os membros do novo Congresso.
Capitão Augusto minimiza o fato de que a CDH, nos últimos anos, tem sido reduto dos partidos da chamada esquerda brasileira. “Eles não vão pegar [a comissão]. Nós vamos brigar para pegar a comissão. Estamos lá para isso. Mas que nós vamos tirar [o colegiado] das mãos deles, vamos”, adverte, dizendo-se disposto a liderar a ocupação de espaços estratégicos da Casa pela bancada da bala.
O grupo a que pertence o parlamentar do PR tem bandeiras claras por ora barradas no Congresso. Fim das visitas íntimas e do “saidão” para presidiários, além da redução da maioridade penal e da progressão de regime para determinados crimes, são alguns exemplos. Outro igualmente (ou ainda mais) polêmico é a revogação do Estatuto do Desarmamento, que criaria condições para que civis portem armas em áreas urbanas e no interior do país. O deputado menciona ainda temas ligados à identidade de gênero, e diz que a bancada religiosa precisa estar à frente da CDH para conduzir a pauta de votações do colegiado a seu gosto.
Balela
De acordo com o cenário almejado pela bancada da bala, as forças de segurança do país é que são mais adequadas para lidar com a temática dos direitos humanos, e não parlamentares ligados a movimentos sociais historicamente engajados na causa.
“Primeiro que a bancada da bala é a que mais se preocupa com a vida. Falar que o pessoal da esquerda se preocupa mais com os direitos humanos do que nós é uma grande balela. A instituição que mais se preocupa com os direitos humanos se chama Polícia Militar de São Paulo, pelo que nós fazemos, em todos os sentidos e aspectos. O pessoal pega casos pontuais, isolados de uma instituição gigantesca – a única, por exemplo em todos os municípios do Brasil, em contato 24 horas por dia com comunidades – e vem imputar para nós que nós não trabalhamos com direitos humanos”, protestou o deputado.
O discurso colide com números do Instituto de Segurança Pública (ISP) do Rio de Janeiro, reduto eleitoral de Jair Bolsonaro: entre fevereiro e setembro deste ano, policiais mataram 1.024 pessoas, um aumento de 42% em relação ao mesmo período de 2017. Especialistas preveem que a matança será ainda mais elevada caso vire lei uma das bandeiras de Bolsonaro, o “excludente de ilicitude”, que livra de punição agentes de segurança pública que matem civis em ações de campo, independentemente de alegado excesso no uso da força.
“A aposta no bangue-bangue também tem contribuído para as mortes de policiais. Em oito meses de intervenção federal [no Rio], o ISP contabilizou 74 baixas nas forças de segurança. Se as promessas eleitorais de 2018 virarem política de Estado em 2019, o número de vítimas só tende a aumentar”, registrou no artigo “Licença para matar” o colunista do jornal O Globo Bernardo Mello Franco, na edição do último domino (21).
Direitos humanos segundo a polícia
Mas Capitão Augusto nega que o problema esteja com a polícia e as demais forças de segurança. Para o deputado, cidadãos têm seus direitos permanentemente resguardados tanto por militares quanto por policiais civis e federais, desde que não saiam da linha.
“Nós trabalhamos muito mais do que esses pseudo-esquerdistas aí. Quero saber o que eles fazem pela dignidade do ser humanos. Na Polícia Militar, 75% de nossas ocorrências são de cunho social, assistencialista. Atendemos a todos, sem distinção, desde o mendigo ao milionário. Então, não tem por que imputar para nós a pecha de que somos contrários [aos direitos humanos]. Vamos mostrar o que são os verdadeiros direitos humanos, e não esses direitos humanos desvirtuados que eles pregam”, acrescentou Capitão Augusto, para quem a atuação da esquerda em relação ao tema virou “chacota no Brasil, sem credibilidade”.
“Só tratam da questão da proteção de marginais”, finalizou.
Para o membro do PR, as dezenas de parlamentares envolvidos na negociação do comando dos colegiados garante o sucesso da pretensão de seu grupo político ideológico. Ele diz acreditar que representantes de outros tipo de frente parlamentar, como a bancada evangélica, devem ajudar na conquista dos postos estratégicos.
“É possível pelo tamanho da bancada. Ligados diretamente à segurança pública, a gente está contabilizando 78 deputados. Tem aqueles que têm outra bandeira como a principal, mas a segunda é a segurança pública. Por exemplo, agricultura e segurança, ou [a causa] cristã e segurança. Então, a gente tem um apoio muito grande”, prevê Capitão Augusto, para quem alguém da bancada da bala tem que comandar a Câmara e, uma vez na cadeira do comando, pautar temas da segurança pública segundo as conveniências do grupo.
Em relação à atual legislatura, o grupo armamentista de fato terá mais força na Câmara a partir de 2019. Como este site mostrou em 12 de outubro, a bancada da bala deve ter um crescimento de ao menos 71% na próxima legislatura (2019-2023), com a eleição de deputados e senadores oriundos do meio militar e de políticos filiados ao PSL de Bolsonaro.
Segundo levantamento da Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais (Feneme), que acompanha a atuação da bancada no Congresso, dos atuais 21 parlamentares que representam os interesses de profissionais que atuam nas polícias Militar e Civil e nas Forças Armadas, o bloco passou a uma composição de 36 integrantes. Desse total, 32 são deputados federais e quatro são senadores, considerando-se os eleitos e os reeleitos na eleição deste ano.
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