Sob ataques e acusada de inação contra as ameaças ao processo eleitoral, a Procuradoria-Geral da República (PGR) partiu para a ação e enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido de busca e apreensão em que detalha o movimento contra a democracia que levou à operação contra o cantor Sérgio Reis e o deputado federal Otoni de Paula nesta sexta-feira. A PGR vem sendo criticada por poupar o governo federal em várias frentes, não só nos ataques às urnas eletrônicas, mas também por exemplo no recente parecer contrário à abertura de investigação do presidente Jair Bolsonaro por não usar máscara em eventos públicos.
A manifestação encaminhada ao STF é assinada pela subprocuradora-geral da República Lindôra Maria Araújo, a mesma do parecer das máscaras. No documento, a PGR afirma que o movimento contra a democracia começou em 7 de julho durante a transmissão da “live” “Vamos fechar Brasília”. Nela, usando como pretexto uma suposta greve dos caminhoneiros, Marcos Antônio Pereira Gomes, dono do canal no Youtube “Zé Trovão a voz das estradas”, teria incitado seus seguidores a invadir o STF e o Congresso. Ele também disse que era para “partir pra cima” do presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM), e do relator, Renan Calheiros (MDB-AL), para “resolver o problema [do aumento] dos combustíveis no Brasil”.
De acordo com a PGR, ele se empolgou com a repercussão da transmissão. Assim, um dia depois, publicou outro vídeo em sua página no “Instagram” chamando “todos os brasileiros, sem exceção” a Brasília “para fazer um grande acampamento” e exigir “a exoneração dos onze ministros do STF” e o “julgamento” deles pelo Superior Tribunal Militar (STM) em razão dos “crimes que eles cometeram”.
“Não trata de mera retórica política de militante partidário, mas, sim, de atos materiais em curso conforme acima descrito, que podem atentar contra a Democracia e o regular funcionamento de suas Instituições”, diz trecho do documento da PGR.
A PGR cita outras manifestações de Marcos Antônio, entre elas uma em 15 de julho, quando ele volta a chamar a população e orienta os seguidores a não disseminarem informações desnecessárias para resguardá-los para a organização da paralisação. A mesma recomendação é feita no dia seguinte. Isso mostra a preocupação de evitar entrar no radar dos órgãos de segurança pública, diz a PGR.
Em 25 de julho, a PGR apontou uma reunião em um hotel em São Paulo, com 20 pessoas, entre elas alguns dos investigados. Foi quando o cantor Sérgio Reis passou a se posicionar pela mobilização. De acordo com a PGR, ele passou a reverberar as ameaças feitas por Marco Antônio.
De acordo com a PGR, em vídeo de 13 de agosto, ao lado de outros investigados, “o artista [Sérgio Reis], visando afrontar e intimar os poderes constituídos, noticia, conjuntamente com Zé Trovão e Eduardo Araújo, que seu grupo pretende para o país por 72 horas e que se o presidente do Senado Federal ‘não fizer nada’, nas outras 72 horas ‘ninguém anda[rá] no país’. De acordo com o cantor ‘vai parar tudo. Não [….] só Brasília, […] o país’. Assegura que ‘nada nunca foi igual ao que vai acontecer’ e, alfim, desafia os ministros do Supremo Tribunal Federal: ‘Se eles não atenderem ao pedido, a cobra vai fumar’, asseverou, em tom de ameaça”.
A PGR também apontou que outro investigado, Alexandre Urbano Raiz Petersen, preside uma associação civil e tem recebido “doações de particulares para financiar a paralisação planejada por Zé Trovão, possivelmente patrocinada por Antonio Galvan e amplamente divulgada por Wellington Macedo e por sua Marcha para a Família”. Galvan é o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja.
As doações iriam para o site “Brasil Livre”, um portal no qual, diz a PGR, é possível acessar um formulário para levantar quantas pessoas vão participar do movimento.
De acordo com a PGR, o deputado Otoni de Paula (PSC-RJ), também investigado, “teria hipotecado apoio ao levante” em uma mensagem publicada no Twitter 14 de agosto “em tom de ameaça ao Senado Federal e a ministros do Supremo, o que, obviamente não se insere na esfera abrangida pela imunidade parlamentar material constitucionalmente prevista”. A PGR apontou ainda a participação de outros investigados “na montagem das caravanas, na intermediação de contatos políticos e na logística de acampamento em Brasília”.
O Globo