O diretor-executivo da Prevent Senior, Pedro Benedito Batista Júnior, reconheceu em depoimento nesta quarta-feira na CPI da Covid que a empresa alterava os prontuários dos pacientes com a doença. Após duas ou três semanas internados, era retirada a informação de que eles tinham Covid-19, e era inserida outra doença no lugar. Senadores da CPI que são médicos, como Otto Alencar (PSD-BA), Humberto Costa (PT-PE) e Rogério Carvalho (PT-SE), acusaram Pedro Benedito de ser desonesto, de mentir e de omitir mortes pela doença.
O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), passou então o executivo de testemunha à condição de investigado na comissão. E informou que vai enviar todas as informações colhidas na comissão sobre a Prevent para a procuradoria de São Paulo, para que a investigação seja aprofundada.
Na sessão, Renan apresentou uma mensagem da Prevent Senior sobre como os pacientes eram classificados ao serem internados. Se havia suspeita ou confirmação de contaminação do coronavírus, passava a constar a CID, que é a sigla para classificação internacional de doenças, da Covid-19. Mas, passado algum tempo dentro do hospital, a orientação era mudar a CID.
“Após 14 dias do início, pacientes de enfermaria, apartamento, ou 21 dias, pacientes com passagem em UTI, leito híbrido, o CID deve ser modificado para qualquer outro, exceto B34.2, para que possamos identificar os pacientes que já não têm mais necessidade de isolamento. Início imediato”, diz trecho de mensagem.
Pedro Benedito confirmou a informação:
— Todos os pacientes com suspeita ou confirmado de covid, na necessidade de isolamento, quando entravam no hospital, recebiam o B34.2, que é o CID de covid. E, após 14 dias, ou 21 dias para quem estava em UTI, se esses pacientes já tinham passado dessa data, o CID podia ser modificado porque não representavam mais risco para a população do hospital — afirmou Pedro Benedito.
Os senadores reagiram.
— Inacreditável O senhor não tem condição de ser médico com a desonestidade que fez agora. Mudar o código de uma doença é crime — afirmou Otto Alencar, que é médico.
— Eles consideram que, depois de 14 dias, o paciente não tem mais covid, ou que depois de 21 dias não tem mais covid. Esses pacientes morreram de quê? De complicações de covid. É covid. É uma fraude — disse Humberto Costa, que também é médico.
— Isso é de uma gravidade sem precedente — disse Rogério Carvalho, outro médico integrante da CPI.
Otto Alencar também disse:
— Não fala a verdade, omite as coisas, não quer falar o que aconteceu no seu hospital por falta de sensibilidade.
O senador lembrou ainda que a maioria das pessoas que pega Covid-19 não precisa ir ao hospital ,porque não apresentam sintomas ou são casos leves. Em seguida, perguntou a Pedro Benedito se cloroquina e azitromicina resolvem o problema dos casos graves.
— Não resolvem — reconheceu Pedro Benedito.
Otto afirmou então haver dados de pacientes graves que foram medicados com tais remédios.
O executivo, porém, negou haver um “kit covid” e que os médicos eram obrigados pela empresa a receitar tais medicamentos. De acordo com o executivo, a empresa enviava os remédios prescritos pelos médicos, o que podia variar de paciente para paciente. E ressaltou que a Prevent Senior foi promotora da vacinação da Covid-19 quando ela começou.
Questionado por Renan, Pedro Benedito também negou ter relação com o governo federal ou com o gabinete paralelo, grupo de assessoramento ao presidente que defendia o tratamento precoce ineficaz. Uma das pessoas apontadas como integrantes do gabinete paralelo é a médica NIse Yamaguchi, que tratou pacientes da Prevent Senior.
Manipulação de dados
Batista Júnior disse que os termos de consentimento das famílias dos pacientes que se submeteram ao tratamento com remédios sem comprovação científica contra a covid estão em posse da empresa. Ele afirmou que profissionais já desligados da empresa adulteraram planilha interna da Prevent Senior para dar a ideia de fraude no dossiê entregue à CPI.
— Eles invadiram o sistema, acessaram a planilha e, mesmo não tendo mais reponsabilidade sobre esse processo, adulteraram a planilha e encaminharam a planilha para a advogada — disse o diretor,afirmando que houve adulteração também em mensagens da empresa.
Ele negou também a existência de pressão sobre os médicos, que, segundo ele, tinham autonomia para prescrever os remédios. O executivo disse ainda que a Prevent Senior tomou medidas para evitar o contágio, como testagem do profissionais, afastamento de quem estava doente, e gastou mais de R$ 80 milhões em equipamentos de proteção individual. Segundo ele, a regularidade da atuação da Prevent Senior foi constatada pelo Ministério Público do Trabalho.
À CPI, Batista Júnior reconheceu que não existe medicação milagrosa:
— Eu tenho uma visão muito clara, depois de tantos meses, que a intervenção do paciente, o teste sendo realizado com mais eficácia, o isolamento e a utilização de tudo que hoje é sabido pode sim amenizar a evolução da doença. E claro a autonomia do médico tem que ser preservada para que ele possa de certa maneira indicar para cada um dos seus pacientes a melhor medida. A minha observação de tratamento ou não precoce é que não existe nenhuma medicação milagrosa.
O relator Renan Calheiros (MDB-AL) perguntou, então, se o médico Anthony Wong, defensor da cloroquina, morreu de Covid-19, mas o diretor da Prevent disse que não poderia passar informações sobre um paciente. Foi exibido então um áudio em que o executivo estaria pressionando um médico a voltar atrás em uma informação repassada à imprensa.
O Globo