Em depoimento à CPI da Covid nesta quarta-feira, o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, afirmou que nunca recebeu ordens do presidente Jair Bolsonaro para fazer algo diferente da conduta adotada em sua gestão. A declaração, no entanto, contradiz um vídeo gravado pelo próprio Pazuello em outubro de 2020, após o então ministro ser desautorizado por Bolsonaro em relação à compra da vacina Coronavac. Na ocasião, ao lado do presidente, Pazuello afirmou que “um manda, outro obedece”.
Pazuello disse ainda que Bolsonaro esteve a par de todo o processo de tratativas para compra da vacina da Pfizer, que se estendeu de julho do ano passado até março deste ano, negou que as ofertas tenham ficado inicialmente sem resposta e se comprometeu a enviar à CPI os registros de comunicações do ministério com a farmacêutica. Antes de uma pausa para almoço, por volta das 14h, os questionamentos também abordaram a falta de oxigênio no Amazonas no início do ano, e a narrativa de Pazuello sobre a crise em Manaus foi contestada por senadores.
O ex-ministro relatou que havia convergência entre posicionamentos dele e do presidente:
— Em momento nenhum o presidente me deu ordem para fazer diferente do que eu já estava fazendo — afirmou Pazuello.
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Ao tentar minimizar o episódio em que disse “um manda e o outro obecede”, Pazuello alegou que a frase representa um “jargão militar, apenas uma posição de internet e mais nada”, sem efeitos práticos. De acordo com o ex-ministro, embora o presidente o tenha desautorizado publicamente sobre o protocolo de intenções de compra da Coronavac, nada foi dito para ele ou para o Ministério da Saúde de forma reservada.
— Ele falou publicamente, para o ministério ou para mim (não disse) nada. Só havia termo de intenção de compra e foi mantido. Uma postagem na internet não é uma ordem. Ordem nunca foi dada — declarou Pazuello. — Nunca o presidente mandou eu desfazer qualquer contrato ou acordo com o Butantan. O presidente também se posiciona como agente político. A posição dele não interferiu em nada no diálogo com o Butantan.
Em outubro do ano passado, no mesmo dia das críticas de Bolsonaro, o secretário-executivo da gestão Pazuello, Elcio Franco, disse que não havia “intenção de compra de vacinas chinesas” ou qualquer compromisso com o governo de São Paulo em relação a vacinas. Na ocasião, Franco disse que tratava-se de um protocolo entre Ministério da Saúde e Instituto Butantan “sem caráter vinculante”.
Pazuello também declarou à CPI que o Brasil não é obrigado a seguir orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) durante a pandemia. Segundo o ex-ministro, ele teve “100% de autonomia” para montar sua equipe, e lembrou que foi convidado diretamente por Bolsonaro, em abril do ano passado, para integrar o Ministério da Saúde ainda como secretário-executivo da pasta.
Em seu relato à CPI, Pazuello argumentou que sua declaração de que “todos queriam o pixulé do final do ano” em março, quando estava deixando o ministério, não referia-se a vantagens indevidas, e sim a sobras do orçamento que poderiam ser reaplicadas após demandas, por exemplo, de gestores locais. Em 2020, porém, ele relatou não ter ocorrido sobra.
— É isso aí. Não tem nada de errado. Não citei ninguém. Não havia ninguém recebendo nada. São os recursos não aplicados — disse Pazuello.
Colapso em Manaus
O tom dos questionamentos ficou mais incisivo no início da tarde, quando os senadores passaram a inquirir Pazuello sobre o colapso no Amazonas no início deste ano, fato que ensejou a instauração da CPI da Covid. Segundo Pazuello, o Ministério da Saúde decidiu acompanhar a situação de perto devido ao aumento expressivo de casos no Amazonas. As autoridades locais, na versão do ex-ministro, não teriam alertado sobre a iminente falta de oxigênio com antecedência, apenas no dia 10 de janeiro, quando o ex-ministro chegou pessoalmente ao local. No entanto, um documento do Ministério da Saúde e um pronunciamento anterior do próprio Pazuello contradizem esta versão.
— Se nós tivéssemos sabido antes, poderíamos ter agido antes. A missão do ministério é programar, colocar recurso, e a execução plena é do estado e do município. Quando chegamos a Manaus vimos que a situação não estava boa — disse Pazuello. — As medidas possíveis a partir do dia 10 foram executadas. No dia 11 abrimos centro integrado de coordenação e controle e no dia 12 começaram a chegar aeronaves trazendo mais oxigênio.
A fala de Pazuello gerou um desentendimento com o senador Eduardo Braga (MDB-AM). O ex-ministro disse que Manaus só registrou falta de oxigênio durante três dias. De acordo com Braga, no entanto, foram 20 dias.
Perguntado também sobre por que não teria usado um avião dos Estados Unidos colocado à disposição para transportar oxigênio para Manaus durante o caos da Saúde na capital amazonense, em janeiro, Pazuello respondeu não saber se as ofertas do insumo haviam sido concretizadas:
— Todas as ofertas de oxigênio, eu aceitei todas. Se não foram concretizadas, eu não sei dizer — disse Pazuello.
Depois, Pazuello afirmou que aceitou, sim, a proposta do avião, mas o Ministério da Saúde não foi demandado a passar especificações:
— O que eu soube do avião foi por telefone. A reposta foi: sim, temos interesse. Agora, em momento algum me chegou uma solicitação de especificações ou demandas que devesse fazer pelo ministério.
Na sequência dos questionamentos, o senador governista Luis Carlos Heinze (PP-RS) e o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM) discutiram depois que Heinze afirmou que foram liberados R$ 2,6 bilhões no ano passado para o governo do Amazonas.
— Que conversa é essa, rapaz? — reagiu Aziz.
— Tinha dinheiro lá — respondeu Heinze.
— Você não está falando a verdade, rapaz. está mentindo. Você é mentiroso. É mentiroso. Não é verdade. Isso é um mentira multiplicada para virar verdade — afirmou Aziz.
— Não me chame de mentiroso. Não sou. Não sou. Vou mostrar,. Não é responsabilidade do governo federal. É do governo do Amazonas — rebateu Heinze.
Depois, Aziz pediu desculpas a Heinze e se justificou:
— Queria pedir desculpas. Eu me excedi. Quando se fala em mortes, não se fala em dinheiro. Não foi falta de dinheiro. Foi falta de oxigênio. Eu peço desculpas, porque estava nervoso — disse Aziz, acrescentando: — Faltou foi logística. Teve incompetência, e não só do governo estadual.
Vacina da Pfizer
Pazuello foi instado pelo relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), a explicar por que não respondeu as propostas para compra de vacinas da Pfizer no ano passado. Pazuello justificou que a empresa não previa transferência de tecnologia para o Brasil e que o contrato tinha “cinco cláusulas que eram assustadoras”: o uso de ativos brasileiros no exterior como garantia; a transferência do foro para resolver disputas para Nova York; pagamento adiantado; assinatura do contrato pelo presidente da República; e não previsão de multa por atraso na entrega.
Segundo o ex-ministro, Bolsonaro foi informado por ele durante todo o processo das tratativas com a Pfizer, de julho do ano passado até março deste ano.
— Uma vacina três vezes mais cara, com todas essas cláusulas, e quantitativos que eram inferiores ao que estávamos negociando, e condições logísticas de 80 graus negativos, e logística sob nossa responsabilidade: “O problema é de vocês” — disse Pazuello. — Ouvi isso na primeira vez e achei muito estranho.
Depois, diante da insistência de Calheiros, Pazuello disse que respondeu “inúmeras vezes” à Pfizer entre agosto e dezembro de 2020, e que guarda todas as comunicações com a farmacêutica. A fala do ex-ministro contradiz o depoimento do CEO da Pfizer, Carlos Murillo, que disse à CPI não ter recebido respostas do governo brasileiro nas primeiras ofertas de vacinas.
— Respondemos inúmeras vezes. De agosto a dezembro. Eu tenho todas a comunicações da Pfizer — disse Pazuello.
— O presidente da Pfizer disse que não houve resposta. Ele mentiu? — rebateu Calheiros.
Pazuello se comprometeu então a enviar toda a documentação com as respostas para a CPI, reafirmou que as propostas foram respondidas “em negociação intensa e direta” e que “não houve decisão de não responder” a farmacêutica.
Pazuello disse ainda que a possibilidade de mudança na legislação para flexibilizar regras de compra de vacinas e garantir o contrato com a Pfizer começou em dezembro de 2020. Na época, a área jurídica do governo avaliou, de acordo com o ex-ministro, que a alteração não poderia partir do Executivo, e sim dos congressistas.
Sobre a adesão do Brasil ao consórcio Covax Facility, Pazuello relatou à CPI que havia preocupação de que o governo assumisse compromisso com um grau de recursos “altíssimo” sem uma garantia de entrega efetiva dos imunizantes. No depoimento de terça-feira, o ex-chanceler Ernesto Araújo afirmou que a decisão do Brasil de aderir ao quantitativo mínimo do consórcio, suficiente para atender 10% da população, partiu do Ministério da Saúde.
Segundo Pazuello, “estar presente no consórcio era mais importante” do que a aquisição de um número elevado de imunizantes no primeiro momento, e que seria possível comprar mais vacinas dentro do consórcio numa etapa posterior, pois não haveria restrições quanto a isso.
Gabinete paralelo
Ao tomar o depoimento de Pazuello, o relator Renan Calheiros perguntou se Bolsonaro tinha uma aconselhamento paralelo, ou seja, fora do Ministério da Saúde, para orientá-lo na política de enfrentamento à pandemia. Pazuello disse que chegou a ter uma reunião com médicos, proposta pelo empresário Carlos Wizard, para um aconselhamento independente. Contudo, de acordo com ele, na primeira reunião o ex-ministro ficou incomodado com o formato proposto por Wizard e o grupo não se reuniu mais.
— Eu não aceitei o formato de aconselhamento que ele tinha pensado — afirmou o ex-ministro.
Segundo Pazuello, ele é amigo de Wizard e os dois ainda mantêm contato informal. O ex-ministro também disse que acredita que não foi esse grupo o responsável pela adoção da cloroquina no tratamento da Covid-19. O general relatou que o próprio Bolsonaro disse que cabia a ele, Pazuello, cuidar da saúde.
— Não quero dizer com isso que qualquer pessoa, e principalmente o presidente a República, não ouça, ou não levante dados, ou não procure avaliar o que está acontecendo em volta dele — ponderou.
Questionado especificamente sobre o deputado Osmar Terra (MDB-RS), que chegou a ser cotado para o Ministério da Saúde e minimizou o impacto da pandemia, Pazuello disse ele “não tinha papel nenhum no ministério”. Pazuello também negou influência dos filhos de Bolsonaro — o senador Flávio Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro e o vereador Carlos Bolsonaro — e até lamentou não falar mais com eles.
Pazuello negou que o Ministério da Saúde tenha considerado uma suposta “imunidade de rebanho”, defendida por Terra e outros aliados de Bolsonaro, como fator que poderia levar a uma queda no contágio pelo coronavírus no ano passado. O ex-ministro admitiu, porém, que sua pasta considerava que haveria redução no contágio em 2021.
— No segundo semestre há uma estabilidade e ela é rompida inicialmente de forma abrupta em Manaus. Claro que naquelas observações do segundo semestre você poderia inferir que a pandemia vinha num grau de controle e com a chegada das vacinas no começo de 2021 íamos estabilizar curvas de contágios e óbitos. Essa era uma perspectiva comum no final de 2020 — avaliou Pazuello.
Cloroquina
Perguntado também sobre ordens de Bolsonaro em relação à cloroquina, remédio que, mesmo sem eficácia no tratamento da Covid-19, era a aposta do presidente contra a pandemia, Pazuello respondeu:
— Em hipótese alguma. O presidente nunca me deu ordens diretas para nada.
Ainda sobre as orientações de Bolsonaro, Pazuello afirmou que foi instruído a executar ações do ministério o mais rapidamente possível. O ex-ministro disse o governo nunca cogitou, na sua gestão, medidas restritivas em âmbito nacional, apenas distribuição de equipamentos e insumos. Embora o presidente tenha ameaçadp, no início deste mês, editar um decreto para “garantir o direito de ir e vir”, Pazuello disse que Bolsonaro nunca teria pedido ao ministério que se abstivesse de medidas de distanciamento social em larga escala.
O ex-ministro disse não ter tomado conhecimento sobre aumento da produção de cloroquina pelo Exército e argumentou que o medicamento, distribuído inclusive para aldeias indígenas, também é usado no combate à malária.
— A distribuição de cloroquina para indígenas é normal para malária, não para Covid. Aliás, eu sou completamente contra distribuição de qualquer medicamento, principalmente cloroquina, ou qualquer um sem a prescrição médica — disse.
Pazuello disse, no entanto, que 29 países têm algum protocolo para uso da cloroquina, incluindo China, Índia, México, República Tcheca, Cuba e Venezuela. Segundo ele, era válido tentar o uso “off label”, ou seja, fora da bula, conforme uma orientação do próprio Ministério da Saúde antes da chegada dele à pasta. Pazuello argumentou à CPI que o ministério se amparou numa norma do Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre autonomia médica para redigir uma nota informativa, com orientações sobre a dosagem de cloroquina e alertas para não utilização na “fase final” da doença.
Sobre as orientações de entidades internacionais, inicialmente Pazuello afirmou que a OMS “não impõe nada”. A OMS vem desaconselhando o uso de cloroquina em pacientes da Covid-19 desde julho de 2020.
— A OMS e a OPAS não impõem nada para nós, nossa decisão é plena, o Brasil é soberano para tomar suas decisões em qualquer área, inclusive saúde, não somos obrigados a seguir nenhum tipo de orientação de OMS, ONU, de lugar nenhum. Somos soberanos — declarou o ex-ministro.
Depois, diante da insistência para saber se o Ministério da Saúde seguia orientações da OMS ou tinha outras, Pazuello mudou o tom e disse que as posições da entidade “não eram contínuas pela própria incerteza da situação”, mas que “amparavam o nosso processo decisório”. Ainda assim, o ex-ministro reiterou que as orientações para combate à pandemia no país “eram do ministério, não da OMS”.
Sem farda
Embora o depoimento tenha se iniciado de forma pacífica, Pazuello foi advertido pelo presidente da CPI, senador Omar Aziz, ao dizer que “não gostaria que fossem feitas” perguntas com “respostas simplórias”. A fala de Pazuello ocorreu após ser instado a responder com objetividade os questionamentos do relator.
— Vossa Excelência não vai dizer para a gente o que a gente vai perguntar ou não. Está aqui para responder as perguntas dos senadores. Para muitas delas, basta um sim ou não. Quando fala muito sem explicar nada fica difícil — rebateu Aziz (veja no vídeo abaixo).
Pazuello chegou ao Senado Federal às 8h49. Ao contrário da expectativa, o general do Exército chegou vestindo um terno civil e não a sua farda militar. Ele chegou acompanhado de uma comitiva — e era esperado por assessores da Secretaria-geral da Presidência da República. Ao iniciar sua fala, Pazuello fez um balanço de sua atuação no Exército e destacou que tem experiência na área de logística.
Logo no início do depoimento, questionado sobre a qualificação que tinha para assumir cargo no Ministério da Saúde, Pazuello disse que no Exército tinha cinco hospitais sob sua responsabilidade, além da saúde de 30 mil homens, e também o atendimento a imigrantes venezuelanos.
— Isso só para falar na área de saúde. Sobre gestão e liderança, eu acredito que seria perguntar se a chuva molha, se um oficial tem competência de gestão e liderança. Se nós não tivermos, temos que começar do zero na nossa instituição. Eu me considero sim, senhor, plenamente apto a exercer o cargo de ministro da Saúde — disse Pazuello.
Em pronunciamento antes das perguntas dos senadores, Pazuello disse que não há medicamentos cientificamente comprovados e, portanto, que a recomendação de fármacos “off label” por médicos é uma prática prevista. Neste momento inicial, Pazuello não citou diretamente a cloroquina, que foi propagandeada em sua gestão no Ministério da Saúde inclusive no colapso em Manaus, investigado pela CPI.
Pazuello também procurou afastar desde sua fala inicial as acusações de demora do governo federal em negociar vacinas com a Pfizer. Segundo o ex-ministro, houve uma opção de sua pasta em ir “escolhendo a tecnologia que pudesse ser transferida para nós, em detrimento apenas da compra direta”. Embora tenha fechado em 2020 um acordo com a farmacêutica AstraZeneca para produção de vacinas em conjunto com a Fiocruz, ainda não foi assinada a transferência de tecnologia.
Indicado por generais
Pazuello afirmou ainda que sua indicação para compor a equipe do Ministério da Saúde foi feita por oficiais generais do governo, e que ele foi convidado diretamente pelo presidente Jair Bolsonaro. O general foi nomeado como secretário-executivo do Ministério da Saúde em abril de 2020, após a saída de Luiz Henrique Mandetta e a nomeação de Nelson Teich como ministro, e assumiu o cargo de Teich após sua exoneração, em maio.
— Entre os dias 14 e 16 de abril de 2020, recebi algumas ligações telefônicas de oficiais generais que estavam no governo federal pra discutir possível indicação para que eu pudesse auxiliar na transição do ministro Mandetta para o ministro que seria nomeado. Confesso que fiquei muito dividido. Estava ciente de minhas responsabilidades como comandante da 12ª Região Militar. Aquela sensação de coração dividido acabou no dia 16 de abril à tarde, quando o comandante supremo das Forças Armadas, nosso presidente da República, me ligou e se posicionou de forma clara e direta pra eu vir — afirmou Pazuello durante seu depoimento à CPI da Covid.
Ao comentar a sua atuação como secretário-executivo na gestão de Teich, Pazuello disse que “aquele primeiro desenho era o melhor que poderíamos ter tido”. Os dois tinham um acordo de que Teich, que é médico, ficaria com a parte finalística da pasta, no diálogo com as secretarias de saúde, enquanto Pazuello cuidaria da área de gestão logística e administrativa.
Pazuello relatou que, antes de assumir o Ministério da Saúde, mantinha uma “relação de amizade simples” com Bolsonaro. Ele disse que não poderia se “eximir da responsabilidade” de assumir a pasta da Saúde em meio à pandemia. Segundo o ex-ministro, a orientação do presidente era “trocar a roda do carro com o carro andando”, sem perda na continuidade das ações de combate à pandemia. De acordo com ele, a ideia era provisória, de transição.
— Não poderia me eximir de tal responsabilidade. O nosso hino diz “verás que um filho teu não foge à luta”, e eu não fugi — afirmou.
Exonerado do cargo de ministro em março deste ano, Pazuello disse que o governo “sempre ressaltou as medidas preventivas” à população, com a busca imediata pelo “atendimento profissional” e a ideia de “manutenção da esperança na vitória”. O ex-ministro alegou que defendeu o uso de máscaras e a higienização das maos como medidas de combate ao coronavírus.
Pazuello também reforçou o discurso do governo de que uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em abril de 2020, que conferiu autonomia a estados e municípios para decretar medidas restritivas na pandemia, teria limitado a atuação do governo federal — argumento que já foi rebatido por juristas e ministros da Corte. Segundo o ex-ministro, só seria possível ao Ministério da Saúde interferir nas ações em estados e municípios com uma intervenção federal.
O ex-ministro defendeu ainda o planejamento de entrega de vacinas aos estados na sua gestão e os acordos com países como China, Inglaterra, Estados Unidos, Índia, Rússia e Uruguai para a vinda de insumos e outros itens de saúde ao Brasil.
Preparação
Como é general da ativa, a convocação de Pazuello foi feita por intermédio da Secretaria-Geral do Exército, onde está lotado atualmente. Portanto, a ida dele à CPI é considerada um ato oficial. Apesar disso, segundo interlocutores, o general foi orientado a comparecer nesta quarta-feira ao Senado usando traje civil.
Segundo interlocutores do general, Pazuello também estudou o estilo de cada senador para evitar ser surpreendido. O militar também teve conversas com o presidente Jair Bolsonaro, pessoalmente no Palácio da Alvorada e por telefone, além de ter sido orientado pelo ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni.
Pazuello foi à CPI acompanhado pelo advogado da União, Diogo Palau, e de dois assessores designados pelo Exército para auxílio a checar datas e documentos a cada tema que for questionado por parlamentares.
Entre militares, existe o receio de que o depoimento de Pazuello associe as ações do governo com o Exército. Um senador governista contou ao GLOBO ter sido procurado por um representante do Exército para que os parlamentares diferenciassem a gestão Pazuello da instituição militar. O objetivo é tentar evitar que a atuação do general na Saúde gere desgaste à Força.
Ajuda de aliados
Após o depoimento do ex-secretário especial de Comunicação Fabio Wajngarten, o Palácio do Planalto cobrou de sua tropa de choque na CPI da Covid uma atuação mais contundente, inclusive cobrando responsabilidades de governadores. Durante a oitava de Pazuello, senadores governistas querem mostrar um vídeo do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciando a compra de cloroquina ao lado do médico infectologista David Uip.
Os aliados do Planalto também vão adotar a estratégia de atribuir a culpa ao governo do Amazonas durante os questionamentos sobre a falta de oxigênio hospital em Manaus, em janeiro. Parlamentares deveram afirmar que Pazuello fez o que pôde para ajudar “um problema que era para ter sido solucionado pelo estado”.
No Twitter, o advogado Zoser Hardman, que foi assessor jurídico no Ministério da Saúde e ajudou na preparação do general para a CPI, disse ainda que “aquele que espera que o ex-ministro Pazuello entre em alguma provocação ou não aguente a maratona se surpreenderá.”
Na sexta-feira passada, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, concedeu habeas corpus ao ex-ministro da Saúde para que ele possa ficar em silêncio em perguntas que possam se auto incriminar. Porém, Pazuello terá que responder a perguntas sobre a conduta de outras pessoas, como Bolsonaro. A defesa, no entanto, quer evitar que Pazuello dê opinião sobre o comportamento do presidente e se limite a responder sobre “fatos objetivos.”
Segundo Hardman, advogado de Pazuello, o ex-ministro está mais preparado do que no dia 5 de maio, primeira data marcada para o comparecimento de Pazuello à CPI. Na ocasião, Pazuello alegou que teve contato com pessoas infectadas e seu depoimento foi adiado para esta quarta-feira.
O Globo