A equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, trabalha para que o chamado Renda Brasil, programa que o governo prepara para substituir o Bolsa Família, comece a vigorar em janeiro de 2021, atendendo a um pedido do presidente Jair Bolsonaro. Ele não quer deixar um vácuo entre o auxílio emergencial concedido durante a pandemia, considerado fundamental para aumentar sua popularidade, e o novo programa social.
Para isso, Guedes precisa enviar a proposta ao Congresso nas próximas semanas. O programa deve atender de 20 a 21 milhões de famílias no país, de acordo com fontes que participam das discussões do Renda Brasil. O novo modelo prevê o pagamento do benefício às 14 milhões de famílias cadastradas no Bolsa Família, mais 6 ou 7 milhões de famílias que recebem o auxílio emergencial. Hoje, o auxílio de R$ 600 atende a cerca de 60 milhões de pessoas.
O programa vai aumentar o valor médio do Bolsa Família, que hoje é de R$ 190, para algo em torno de R$ 300. Com isso, os gastos do governo nesse campo vão praticamente dobrar. Eles vão sair de pouco mais de R$ 30 bilhões por ano do atual Bolsa Família para R$ 60 bilhões no Renda Brasil.
É preciso, para isso, encontrar dinheiro e espaço no teto de gastos. Por isso, Guedes vai atrelar as discussões sobre o teto de gastos com o Renda Brasil. O tema foi discutido na reunião desta segunda-feira entre Bolsonaro e integrantes da equipe econômica.
Uma das pautas dessa reunião foi a prorrogação do auxílio emergencial até o fim deste ano, com o valor do benefício entre R$ 200 e R$ 300 — no lugar dos R$ 600 de hoje. Esse seria o valor do Renda Brasil e, para evitar o vácuo, Bolsonaro quer o novo programa social em janeiro.
Junto com corte de gastos
A criação do Renda Brasil deve seguir para o Congresso como uma proposta de emenda à Constituição (PEC), já que vai alterar benefícios hoje previstos na Constituição, como o Abono Salarial, concedido a quem recebe até dois salários mínimos. Esse programa custa R$ 20 bilhões e é considerado pelo governo como pouco focalizado.
Por isso, a ideia é extinguir esse benefício e incorporá-lo ao Renda Brasil. Faltariam ainda R$ 10 bilhões. Esse dinheiro poderia vir de outros programas, como o seguro-defeso (pago a pescadores) e o salário-família. Este último é um benefício previdenciário do INSS para empregados de baixa renda que têm filhos de até 14 anos ou filhos com deficiência.
O governo considera programas como esses como ineficientes e pouco focalizados, ou seja, atingem pessoas que não precisam do benefício, segundo o entendimento da equipe econômica. Por isso, dizem ser mais eficiente pegar esse recurso e transferir para famílias carentes.
Além da fusão de programas sociais, o governo planeja abrir espaço para o Renda Brasil dentro das medidas de ajuste nas contas, por isso Guedes quer atrelar as duas discussões. A intenção é colocar tudo em um só texto voltado para economizar despesas obrigatórias, que têm maior resistência política, e o Renda Brasil, de tramitação mais fácil.
Guedes classifica as medidas fiscais como “furar o piso” do Orçamento, ou seja, frear o crescimento das despesas obrigatórias, como salários e benefícios, e desvincular receitas hoje destinadas a fins específicos. Por isso, além do auxílio, essa PEC pode servir também para liberar recursos para mais investimentos, como pressionam ministros. O Orçamento de 2021 está fortemente pressionado por gastos obrigatórios, o que reduziu espaço para a manutenção da máquina e investimentos.
Voltado para ‘invisíveis’
Guedes tem dito a interlocutores que o Renda Brasil será amplo, mas sustentável. As 6 milhões ou 7 milhões de famílias a mais que receberiam o benefício são vistas pelo governo como “invisíveis”, que não recebiam nenhum benefício social, apesar de precisarem deles para sobreviver.
O auxílio emergencial já foi pago a mais de 60 milhões de pessoas, mas várias podem fazer parte de uma mesma família. Deste total, a equipe econômica avalia que uma parcela significativa voltará a ter renda depois de superada a fase mais crítica do combate ao coronavírus. Ou seja, não precisariam mais do benefício.
Desse grupo, porém, de 6 a 7 milhões de famílias vão seguir em situação de vulnerabilidade e precisam ser incluídas em algum tipo de benefício social. Por isso, os técnicos estão fechando uma primeira versão do Renda Brasil incluindo as 14 milhões de famílias do Bolsa Família e as novas famílias identificadas pelo auxílio emergencial.
O Globo