Sob o comando do ministro Sergio Moro (Justiça), a Polícia Federal fez no primeiro semestre deste ano a menor quantidade de operações desde 2014. Foram realizadas, entre janeiro e junho, 204 ações, número mais baixo que o registrado nos nove semestres anteriores.
Apesar de menos atividades nas ruas, cresceram o número de investigações e os valores de bens apreendidos de 2018 para 2019. Os dados foram levantados pela PF a pedido da Folha.
No período entre 2009 e 2019, o pico de produtividade se deu no semestre imediatamente anterior ao de estreia de Moro no governo de Jair Bolsonaro. Foram 360 ações entre julho e dezembro de 2018 —1,9 por dia.
Historicamente, os primeiros semestres têm menos operações do que os seis meses finais de um ano –isso porque, na primeira metade de um ano, há mais dias de folga para o Judiciário, que é quem autoriza as medidas de busca e apreensão e de prisão.
Na primeira metade do ano passado, a PF fez 269 operações, média de 1,4 por dia, contra 1,1 entre janeiro e junho de 2019.
Os resultados da atual gestão só ficam à frente dos registrados até o primeiro semestre de 2014 —quando houve 178 operações.
Aquele ano marcou o início da Lava Jato, com maior ênfase de atuação da PF contra crimes do colarinho branco.
Bolsonaro se elegeu no ano passado prometendo rigor no combate às atividades ilegais, e fez do ex-juiz da Lava Jato o timoneiro dessa missão.
Os últimos meses, no entanto, têm sido marcados por tentativas de interferência do presidente na pasta do ministro.
Em agosto, Bolsonaro anunciou a troca do superintendente do órgão no Rio, Ricardo Saadi, disse ser ele “quem manda” na corporação e ameaçou substituir seu diretor-geral, Maurício Valeixo, da confiança de Moro.
“Se eu trocar hoje [o diretor-geral], qual o problema? Ele é subordinado a mim, não ao ministro. Sou eu que indico, está na lei.”
Depois de dizer à Folha que a PF precisa de uma “arejada”, o presidente não tocou mais no assunto. A diretoria do órgão considera que o clima ficou mais tranquilo, mas Bolsonaro ainda não afiançou a permanência de Valeixo.
A PF alega que vários fatores podem ter impactado seu desempenho, como a queda de 10% do efetivo policial na ativa desde 2016. E pondera que os números deste ano ainda refletem os resultados de investigações feitas em governos anteriores.
Argumenta também que há outros indicadores de seu desempenho em alta, a exemplo da quantidade de apreensões.
Em casos relacionados a crime organizado, facções criminosas e crimes violentos, foram recolhidos R$ 548,1 milhões em patrimônio de investigados de janeiro a julho deste ano, mais que em todo 2018 (R$ 451,5 milhões).
A performance, afirma a PF, também é considerada satisfatória nas apreensões de drogas. Até agosto de 2019, foram 67 toneladas de cocaína, quase o total de todo o ano passado.
No mesmo período, foram tomados de traficantes 364,8 mil comprimidos de ecstasy, contra 295,3 mil em todo 2018.
O órgão não detalhou, em cada ano, a quantidade de operações conforme os tipos de crime combatidos.
Em quase 11 anos (de 2009 a 10 de setembro deste ano), corrupção e tráfico de drogas foram os principais alvos das ações do órgão. Estiveram na mira de quase 40% das 4.256 investidas do período. Foram 869 operações envolvendo entorpecentes e mais 822 de esquemas relacionados a pagamento de propinas e desvios na administração pública.
Houve também bastante ênfase contra crimes fazendários (770 ações), previdenciários (400), cibernéticos (254) e ambientais (238).
A PF disse, em nota, que vários fatores podem influenciar no aumento ou diminuição “temporário e sazonal do número de operações”, entre eles o quantitativo de policiais.
Além disso, o órgão justificou que, em 2015 e 2017, duas mudanças nos normativos internos da PF trouxeram um rol maior de exigências para que uma ação seja considerada “operação especial”, tipo divulgado à imprensa.
“Assim, muitas ações que, em um passado próximo, eram consideradas operações, hoje não ingressam na estatística por não satisfazerem tais critérios”.
A PF sustenta ainda que o número de operações deflagradas não reflete, obrigatoriamente, o número de operações em andamento. Como exemplo, diz que havia cerca de 500 operações em curso no início do segundo semestre de 2018 e, atualmente, 738.
“Cada operação tem seu tempo de maturação e a deflagração é apenas a etapa final de uma operação, que pode ter durado meses de trabalho.”
O Ministério da Justiça afirmou, em nota, que cada investigação ou operação “tem a sua própria marcha, a depender da complexidade do caso, do número de investigados, do conjunto probatório a ser produzido e das inúmeras outras variáveis que o objeto da investigação impõe”.
“Por outro lado, é sabido que, a cada caso desvendado, as organizações criminosas migram as suas práticas e formas de operar no mundo do crime, o que dificulta o trabalho das autoridades competentes para investigar os fatos”, argumentou.
Questionada se houve redução de verba para as ações, a pasta pontuou que o orçamento discricionário da PF “vem sendo majorado nos últimos anos” e cresceu 9% em 2019, ante 2018. Os valores não foram detalhados.
Folha